quinta-feira, 7 de setembro de 2017

"Deu o Dízimo ao Assaltante" e "Inundação" - Crônicas Para Rir e Chorar - Juarez Azevedo


"Deu Dízimo ao Assaltante" - Crônicas Para Rir e Chorar -  Juarez  Azevedo

                             Não adiantava mesmo o mais lúcido dos argumentos, Teotônio era um crente que não tinha o menor acanhamento em dizer a quem quer que fosse que era um anti-dizimista. De quando em quando ele apresentava suas razões, que julgava convincente:
- Não dou o dízimo porque é coisa da Lei, eu sou é Cristão e não um Judeu, entenderam? - Dizia ele, e acrescentava quando alguém tentava rebater a sua fraca argumentação: - "Deus ama ao que dá com alegria", ouviram?
                          Zé do Carmo não se conformava com as atitudes de Teotônio, crente de razoáveis recursos financeiros, mas que demonstrava um comportamento que mais o assemelhava a um grandessíssimo avarento. às vezes, Zé do Carmo, desejando perturbar Teotônio, insistia com perguntas indiscretas, a propósito de dinheiro e Igreja:
- Me diga uma coisa, Teotônio, você é contra o dízimo porque deseja dar mais do que o dízimo ou porque sempre dá menos do que o dízimo para o sustento do trabalho da Igreja?




                            Zé do Carmo, bom crente, mas excessivamente positivo, comentava com outros membros da Igreja:
- Eu não entendo certos crentes que só sabem dar com alegria pouco, sempre menos que os dez por cento do Senhor para a Igreja...
                           Como pessoa remediada, vez por outra, Teotônio dava uma oferta significativa, seu nome aparecia na relação dos contribuintes e ele se dava por satisfeito. Oferta regular, mensalmente, dízimo sistemático, nada disso fazia parte de suas preocupações. Todo mundo observava o procedimento de Teotônio e, considerando a sua condição de pessoa de apreciáveis recursos financeiros, não faltava quem o censurasse:
- Aquilo é u unha-de-fome, um amarrado, um mão-fechada para a Igreja, vai ver que a farmácia finda levando o ganho dele todo.



                               Uma quarta-feira à noite, depois de fechar a mercearia um pouco mais tarde, pois sendo a quinta um feriado, o movimento do dia havia sido fora do comum. Teotônio botou o apurado todo em uma bolsa de couro e, apressado, pegou o seu corcel do ano e dirigiu-se rapidamente à Igreja, a fim de pegar o finalzinho do culto e levar a mulher para casa.
                                Estava sentado no último banco, pensando em fazer a última refeição e descansar das labutas de um dia enfadonho de trabalho contínuo, quando sente o roçar incômodo de um cano de revólver nas costelas e uma voz grossa e ameaçadora soar no seu ouvido:
- Não se mexa, não fale e nem grite. isto é um assalto; se gritar, morre!

              Teotônio começou a tremer de medo, mas se controlou e perguntou ao bandido:

- Afinal, diga logo, o que você quer?
- Pra começo de conversa, passa logo para cá a pasta, o relógio, o anel e tudo o mais de valor que você carrega consigo. - Falou bem baixinho o marginal.

              Teotônio entregou tudo, não reclamou nada.





- Agora, vá lá na frente e diga ao Pastor que pare o culto e lhe entregue as sacolas de recolher as coletas. Diga mais a ele: que somos cinco e que mande cantar um hino que nós vamos receber dos crentes, nas sacolas, o dinheiro, jóias, objetos de valor, tudo o que for possível. e você vai nos ajudar no recolhimento, está ouvindo? - Gritou mais alto o bandido.

                              Todos olharam para trás e, ainda trêmulo, Teotônio caminhou para frente, a fim de cumprir o mandado do ladrão. No momento quando já segurava as sacolas, mas quatro assaltantes apareceram de revólver em punho, apontando ameaçadoramente a arma para o auditório e dizendo a uma voz:
- Se obedecerem direitinho, entregando tudo, nada acontecerá.



                                O pastor mandou cantar o hino das ofertas, Teotônio ajudou os assaltantes a recolher tudo, como manda o figurino. quem passasse e ouvisse o cântico dos crentes concluiria tratar-se de um momento de dedicação, e nunca, de uma só vez, um assalto rendeu tanto para os marginais. Ao final, os ladrões falaram para Teotônio, meio aborrecidos:
- Vai, coroa, nos leva no teu carro para fora daqui, vai!
- Por favor, não façam isso comigo. - Suplicou Teotônio.



                                     Na segunda ameaça, Teotônio não teve dúvidas, saiu com os bandidos, amedrontado, como quem se despede deste mundo. Já distante, tomaram a chave do carro, abandonaram Teotônio em um lugar ermo e ainda lhe deram uns empurrões bem seguros. Teotônio, ali mesmo, deu graças a Deus por haver escapado com vida de um episódio tão dramático. Chegou em casa tarde, a pé, vendo a ansiedade e angústia estampadas nos rostos dos familiares e amigos que o esperavam. Zé do Carmo estava também entre os ansiosos. Teotônio fez as contas do que perdera no assalto, incluindo as jóias da mulher: Dez mil reais, fora um carro, novinho em folha.

- Vamos mobilizar a polícia imediatamente, não é, Teotônio?
- Quanto a mim, não. - Respondeu Teotônio e explicou: - Eu nunca fui dizimista, portanto um ladrão com letra maiúscula, e, como diz o ditado popular: "Ladrão que rouba de ladrão, tem cem anos de perdão...", por mim, os bandidos já estão perdoados.

Hoje, quando perguntam a Teotônio se ele é mesmo dizimista, ele responde, com a maior ousadia deste mundo:
- D bruto! Não desconto nem o imposto...


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I  N  U  N  D  A  Ç  Ã  O  - Crônicas Para Rir e Chorar  -  Juarez  Azevedo




                             Imaginem uma enchente. As águas transbordando e avançando em turbilhão.destruindo tudo e inundando as casas. Milhares de pessoas desabrigadas, a ameaça das epidemias e o alvoroço da população.
                             A casa do Diácono Efraim já estava cercada pela água. Sentado em uma cadeira, seu Jacó lia atentamente a sua Bíblia. A água começou a subir rapidamente, penetrou na sala, molhou tudo. Seu Jacó continuava lendo a Bíblia Sagrada.
                            Quando a água subiu a ponto de afogar a cadeira onde o velho estava sentado, ele não se perturbou: Subiu na mesa e, com toda a serenidade, continuou lendo a Bíblia.







                               Mas, a água continuou subindo. Amigos, parentes e estranhos se uniam, formando equipes de salvamento. Quando o grupo foi buscar seu Jacó, lá o encontraram sentado em uma cadeira, que repousava sobre a mesa que, aquela altura, já estava completamente submersa.
                              Na cadeira, em cima da mesa, seu Jacó, de óculos, indiferente a tudo que se passava ao redor, continuava impassível, lendo e recitando os Salmos de Davi.




                             Quando o grupo de salvamento chegou, com uma canoa rústica, para levar seu Jacó, ouviu dele uma frase pronunciada com toda a tranquilidade:
- Bem que não era coisa má entrar no céu lendo a Bíblia...
                             Minha homenagem ao velho Jacó Benjamim, homem santo de Deus, exemplo de fé e pureza de vida, varão notável pela incomparável beleza de suas virtudes cristãs.






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